Ignore o Autor, é o que determina o anteprojeto do MinC
Por Samuel Fahel – gerente executivo Jurídico do Ecad
A nomeação de Gilberto Gil ao Ministério da Cultura despertou nos artistas uma grande esperança, justamente num momento em que apreciávamos o declínio da indústria fonográfica e o crescente monopólio das grandes redes de comunicação. Naquele instante os autores se orgulhavam da nova Lei Autoral, que tornou efetiva a defesa de seus direitos.
Nesse contexto todos já percebiam o grande filão, as comunicações das obras através da Internet. Ou seja, ao lado da redução de um mercado, possuíam os autores a certeza de que poderiam continuar criando, pois as alterações tecnológicas não prejudicariam a exploração das obras.
Não se tem dúvida que o criador pode viver de música no Brasil, pois à medida da execução de suas obras, crescerão seus rendimentos, tudo isso graças à evolução da gestão coletiva concretizada no Ecad. Isso, claro, desinteressa a alguns… daí tomarem corpo os movimentos de utilização livre, curiosamente encampados pelo MinC, revelando o prestígio daqueles a quem o respeito aos direitos autorais ofende os lucros.
Por certo, ninguém se atreve a confessar que não quer retribuir pela música, mas há um grande interesse econômico que busca, através de pano de fundo, tornar a Lei Autoral um instrumento inócuo, o que se concretizaria através do anteprojeto submetido pelo Ministério da Cultura a "consulta pública".
Mas não é só, todos sabem que ao invés de revelar suas intenções, cuidou o Ministério da "Cultura", nos últimos anos, de promover monólogos, onde os interessados jamais apreciaram seus projetos. Ficou saliente que o movimento apenas se prestou à desconstrução do direito, tanto que aqueles que se ofereceram a mal falar a gestão coletiva da música ganharam palco, tudo para criar um falso clima de irresignação contra os que trabalharam pelo seu sucesso. Aglutinaram-se a esse movimento, como todos percebemos e lastimamos, apenas interesseiros e oportunistas.
Deve-se notar: o discurso ministerial e as promessas que embalam o anteprojeto, não se realizam em seu texto, já por tantos dito, maniqueísta e facista. Aliás, essa tem sido uma tônica dos atuais "novos tempos", destes "nunca antes na história deste país": censurar, negar as insofismáveis conquistas da democracia brasileira, a exemplo do que se vem renitentemente fazendo com a imprensa brasileira, rotineiramente taxada de exorbitante e em alguns momentos ameaçada de ter cerceada sua sagrada liberdade. Os muitos episódios estão aí a serem relembrados.
O Autor agora, a mero pretexto de "abuso", ou "vedação de acesso à cultura" rótulos que lhe impõem os não pagadores, teriam de submeter-se à licença obrigatória, intermediação do MinC e penalidades do Sistema de Concorrência, como se seus direitos fossem consumíveis e suas músicas produtos. Poucos não são os artigos do anteprojeto que condicionam a justa exploração da obra aos órgãos do MinC e quem sobre ele imperar ou influenciar.
A verdade é que temos uma lei capaz de proteger os interesses dos Autores, inclusive nos ambientes virtuais, e este Poder que ora busca revogar a lei esculpida nas Casas Legislativas, ofertando texto produzido às escuras nos seus gabinetes, busca afastar o socorro judicial aos Artistas, através de dispositivos sutis.
As "mudanças", conforme apreciamos no anteprojeto em consulta, apenas interessam àqueles que não querem pagar os direitos autorais, ou mesmo aos que não se resignam às vantagens do coletivo.