Projeto prejudica os direitos autorais
O Ministério da Cultura propôs, por meio de anteprojeto de lei, alterações na lei de direitos autorais em vigor. Porém a lei autoral atual possui somente doze anos e é resultado de dez anos de negociações entre a classe artística e o Governo, tendo sido aprovada pelo Congresso Nacional após a consolidação de todas as sugestões feitas pelas partes interessadas. Agora, em apenas 75 dias, o MinC quer mudar toda uma história conquistada por muito suor da classe artística. O anteprojeto proposto pelo Ministério da Cultura traz grandes prejuízos aos autores.
Com o argumento de proporcionar maior acesso do povo à cultura, o anteprojeto do MinC propõe que os artistas abram mão de seus direitos autorais. Não somos contrários à disseminação da cultura, porém, cabe ao Estado criar políticas públicas de acesso à cultura, preservando o pagamento dos direitos autorais aos criadores das obras que serão utilizadas em seus projetos de desenvolvimento da cultura. Como pode um Ministério elaborar um anteprojeto de lei sem levar em conta os argumentos da instituição que defende os direitos de de 275 mil artistas?
Tal projeto de lei é uma aberração jurídica e flagrantemente inconstitucional ao dispensar a necessidade de autorização do autor para uso de sua criação. A Constituição Federal brasileira resguarda ao autor o direito exclusivo de utilização de sua obra e assim é em todos os lugares do mundo.
São utilizados vários argumentos para que a lei autoral brasileira seja alterada. Um deles é o advento da internet, o que, no caso da execução pública musical, não exige mudança. A lei atual possui os conceitos fundamentais para a proteção das criações intelectuais, inclusive no ambiente digital, como é o caso da internet.
Outro argumento utilizado é a necessidade de supervisão ao Ecad. Porém, no fundo, quais serão as reais intenções do Ministério da Cultura? Entendemos que o MinC quer supervisionar o Ecad e as associações de música com o objetivo de controlar o preço do direito autoral em benefício dos usuários de música inadimplentes, como emissoras de rádios e TVs, provedores de internet e estabelecimentos comerciais, usando a desculpa de que propõe mudanças para proteger os artistas. Se assim fosse, deveria ter explicitado no anteprojeto de lei punições severas para quem usa as criações alheias sem estar autorizado e sem efetuar o pagamento do direito autoral, um desrespeito aos artistas que se dedicam a criar obras que desenvolvem a cultura deste país.
As associações brasileiras de música foram criadas sem a intervenção do Estado, há mais de 70 anos, muito antes da criação do Ecad, a partir do esforço de seus próprios associados, sem nunca contar com o apoio de qualquer iniciativa estatal. Os artistas são donos das associações de música, e as associações são donas do Ecad. Portanto, não há razão para intervir nesse processo de gestão coletiva de bens privados que vem obtendo resultados recordes de distribuição de direitos autorais aos artistas ano após ano. No ano de 2009, sem qualquer intervenção do governo, o Ecad distribuiu R$318 milhões em direitos autorais de execução pública musical para cerca de 81.250 titulares de música, entre eles compositores, intérpretes e músicos.
A atuação da instituição é transparente. Qualquer pessoa pode fiscalizar o seu trabalho, inclusive os artistas, através das suas associações. Prova disso é que seus balanços patrimonial e social, além do seu relatório de sustentabilidade, estão disponíveis para consulta do público durante todo o ano no site do Ecad e são publicados em jornal de grande circulação anualmente. Muitos desconhecem, mas o Ecad é uma empresa privada sem fins lucrativos, e assim como qualquer outra companhia, presta contas constantemente ao Governo através da Receita Federal e do INSS.
A esperança é que o bom senso prevaleça, principalmente num ano eleitoral, quando questões delicadas como essas devem ser discutidas com todas as partes envolvidas e sempre com prudência e respeito à nossa Constituição e aos criadores de obras intelectuais.
Artigo redigido por Glória Braga – Superintendente executiva do Ecad