Estado não pode se apropriar de criação intelectual
O projeto de lei que visa alterar a Lei de Direitos Autorais enche aos brasileiros de irresignação, principalmente quando manejada a Constituição Federal e, "de cara", percebe-se que os direitos autorais estão inseridos no campo dos direitos individuais, ou seja, privado.
Assim, absurdo é o projeto de lei que visa alterar a Lei de Direitos Autorais, pois trata destes como se públicos fossem, não obstante pela Carta Política de 1988, cujo objetivo é garantir também direitos individuais e coletivos de cada cidadão (ao menos no discurso democrático do Estado), estes direitos tenham sido objeto de proteção de direito individual e privado.
Analisando com carinho o dito projeto, que pretende o Estado Democrático de Direito, apropria-se dos direitos de aproveitamento econômico ou não de obras musicais privadas. Um absurdo. O que não pode o Brasil entender é como se pode estatizar uma ideia privada, pois o referido projeto nada mais pretende do que isto. Onde já se viu ter o Ministério da Cultura, poderes para autorizar o uso de obras musicais, quando o seu autor não o fizer? Há disposição legal para esta sub-rogação de direito de autorização?
Não há, e qualquer Legislação criada neste sentido contraria a Constituição Federal, que em seu artigo 5º, inciso XXVII, concede ao autor esta exclusividade, quando assim dispõe: "aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar".
Assim, verificando que o direito autoral é vitalício, qualquer legislação que venha sub-rogar qualquer órgão estatal nos direitos de autorização de utilização de obras musicais, seja sob qual motivo for, é inconstitucional. E, devemos lembrar, ainda, dos direitos morais do autor, não só os patrimoniais, pois sendo aqueles personalíssimos, certo é que ninguém poderá autorizá-los. Pergunta-se então: como o MinC poderá autorizar, por qual motivo ou finalidade for, a utilização somente da cota parte patrimonial da obra? Como sub-rogar-se nos direitos morais.
Aceitar este fato seria o mesmo que autorizar o Estado a tomar para si o direito sobre a composição musical, um trabalho intelectual, uma ideia de seu autor e este fato não coaduna com a ideia de direito privado que é o direito autoral.
Cuidado senhores pesquisadores, pois num futuro não muito distante, não haverá mais direito de autorizar o uso do resultado benéfico de suas pesquisas, pois o fascismo de nosso governo quer uma colher de tudo o que é privado, não bastando os elevados impostos que já cobram dos valores angariados com as obras e ideias privadas.
Não podemos, pois, aceitar que a obra musical possa ser autorizada por outrem que não o seu próprio titular, pois este é o pai da obra e apenas ele tem direitos sobre ela. Este mesmo Estado defende tanto que acabará com a pirataria, mas agora, de forma menos clara, tenta piratear a autorização da obra musical, se esta não for autorizada por seu compositor e isto está no referido projeto.
Por que o Estado não se preocupa em combater a pirataria e dar meios para que a inadimplência dos direitos autorais diminua ainda mais, ao invés de tentar reduzir as possibilidades de cobrança destes? Certamente esta atitude, cooperaria muito mais com a cultura, do que obrigar os titulares de direitos autorais a autorizar a utilização de suas obras de forma gratuita.
O que querem sim, ao que parece, é um novo mensalão, agora dos direitos autorais, pois quando nada se arrecadava, ninguém queria sequer saber o que acontecia com o Ecad, agora, com toda sua organização, com recordes de arrecadação, inclusive provenientes de vitórias judiciais, todos querem uma colher, inclusive o MinC.
Como disse Nelson Motta em resposta a. Tim Rescala: "não é o Estado quem vai por ordem na casa" (se é que existe a desordem proclamada e não comprovada por TIM Rescala) e, para se chegar a esta conclusão, basta verificar que a melhora na atuação do Ecad que ocorre ano a ano, ocorreu sem qualquer intervenção estatal.
E mais, quanto ao percentual repassado ao Ecad e às associações, certo é que tratam-se de valores para o custeio das despesas de arrecadação, administração e distribuição dos direitos autorais, ou será que o MinC fará tudo isto sem cobrar nenhum valor dos titulares de direitos autorais? Certo é que não.
E esta resposta é imperiosa, pois chegamos à conclusão, então, que o que o MinC quer é arrecadar não só o Imposto de Renda sobre os valores recebidos a título de direitos autorais, mas também o percentual para fins de custeio da arrecadação, administração distribuição destes direitos.
Mas será que terá a mesma garra do Ecad e das associações que o compõem? Conclui-se facilmente que não, pois basta lembrarmos da CPMF, que o Estado sempre disse que seria destinada à saúde, contudo, hoje, para se conseguir um medicamento com um custo um pouco mais elevado, para tratamento muitas vezes de uma doença terminal, é necessário uma ordem judicial. Basta ainda olharmos que a saúde está pior do que estava antes da imposição da CPMF.
Assim sendo, como foi a CPMF, este projeto é um engodo do Estado, que se diz democrático, mas quer meter o bedelho em direitos privados. Assim, se cabe ao Estado proporcionar o acesso à cultura, que o faça às suas custas e não às custas daqueles que já sofrem muito em razão da lentidão judiciária. A organização judiciária também pertence ao Estado e a constituição traz em seu bojo o Princípio da Razoável Duração do Processo, contudo, pergunta-se, quanto tempo dura um processo?
Ora, já são dois de muitos exemplos de que o Estado não tem condições sequer para cumprir com os comandos constitucionais que lhe são atribuídos – saúde e Justiça. E esta observação deixa mais uma pergunta: De que forma quer ter condições e competência para cuidar e gerir direitos privados? A todos os interessados, quando inclinados a eventualmente opinar de forma favorável ao projeto de lei que visa alterar a Lei de Direitos Autorais, lembrem-se da CPMF que foi criada pelo Estado (como o dito projeto), para a melhora da saúde, que só piorou e, da Emenda Constitucional 45, que resultou no Princípio da Razoável Duração do Processo, que nenhuma repercussão teve até hoje.
Conclui-se que o projeto, além de inconstitucional, é arcaico e fascista, pois não se pode aceitar que a utilização musical tenha a autorização de outro que não aquele que possui o dom de criá-la. Diga não ao projeto de lei que visa alterar a Lei de Direitos Autorais.
Por Judite Beatriz Turim