DIREITOS AUTORAIS – Reforma na lei pode prejudicar autores
O Governo Federal, por meio do Ministério da Cultura (MinC), propôs uma reforma na Lei de Direitos Autorais (9.610/98). A alegação é que existe a necessidade de harmonizar a proteção dos direitos dos autores e artistas, com o acesso do cidadão ao conhecimento e à cultura, e a segurança jurídica dos investidores da área cultural. Na prática, a nova legislação flexibiliza a permissão para o uso de obras – sejam literárias, artísticas ou científicas -, dispensando em alguns casos o pagamento ou a prévia autorização do artista.
”Aparentemente parece que vem a benefício da cultura, mas existem outros interesses embutidos. As modificações dão asas para quem está acostumado a sonegar e a fraudar”, afirma Ludovico Albino Savaris, advogado especialista em direitos autorais. Segundo ele, o Estado está querendo intervir em um ramo privado sem necessidade.
Em entrevista à FOLHA, Savaris discute a atual legislação, explica como funciona a utilização de obras para fins didáticos e defende o modelo de trabalho do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) como a melhor forma de fiscalização.
Qual avaliação o senhor faz sobre a atual legislação que rege os direitos autorais no País?
A nossa lei é uma das mais desenvolvidas mundialmente falando. Ela atende perfeitamente as suas necessidades, sendo avançada e atual. E eles querem fazer uma retaliação geral, mudando a lei em si. O que se observa é que existem outros interesses que envolvem a proteção do autor.
E quais seriam esses interesses?
O Estado está querendo intervir em um ramo privado. As associações de direitos autorais são autossuficientes para administrar seus próprios interesses. Mas, por se tratar de um segmento cultural que envolve uma quantidade econômica razoável, o Estado acaba tendo fins políticos nesse setor. E depois não se sabe qual a destinação do dinheiro. Já o Ecad é transparente, dá acesso aos titulares e aos interessados que têm direito a retribuição com a utilização de obras de pessoas ligadas a cultura brasileira.
A diferenciação entre os fins educacionais e comerciais é bem clara na atual legislação?
Sim. Independentemente de autorização, a lei permite a utilização de obras para fins educacionais. Se o fim é didático é evidente que o acesso é livre, podendo utilizar e debater a obra sem a necessidade de autorização e da restituição dos direitos autorais.
Críticos apontam que a lei em vigor dificulta a cópia de textos para uso em sala de aula, por exemplo. O que o senhor acha disso?
Se fizer uma pesquisa nas faculdades será constatado que os alunos têm absoluto acesso a toda a cultura. O que estão querendo fazer é oferecer acesso ao consumidor passando por cima do direito fundamental que protege a criação intelectual. Essa modificação vai enfraquecer e desmotivar os autores, pois querem tirar a liberdade do autor autorizar ou não a divulgação da sua obra. E isso é um direito consagrado mundialmente. O autor tem a livre prerrogativa de autorizar ou não a divulgação da sua obra.
Então no caso de obras educacionais o direito do autor não seria completamente respeitado?
Não é um desrespeito, pois as obras são utilizadas para fins didáticos. A própria lei, no artigo 46, traz que não há necessidade de se obter a autorização do autor. E a reforma na legislação não altera isso.
Um dos objetivos da reforma da legislação é proporcionar maior flexibilidade para o autor discutir prazos e condições de cessão dos direitos.
Mas essa flexibilização nada mais é do que uma ”pontada” naqueles que utilizam comercialmente a obra. Essa flexibilização não vem em prol da cultura. Essas janelas que a nova lei cria estão dando asas para quem está acostumado a sonegar e fraudar direitos autorais.
Então, qual a melhor forma de fiscalizar os direitos autorais?
Por meio do Ecad. O sistema facilita a fiscalização, a arrecadação e a distribuição dos direitos autorais. O Ecad representa todas as associações e promove as medidas judiciais cabíveis em caso de violação dos direitos. O sistema tem se mostrado eficiente e os titulares estão satisfeitos.
Como deveria ser o acesso ao uso e à difusão de usuários em situações supostamente especiais, como igrejas, entes públicos e rádios comunitárias?
Eles se dizem especiais. A igreja, por exemplo, diz que está laborando a serviço de Deus. Mas os titulares de obras de caráter gospel registram o que fazem em associações e em editoras. E qual a finalidade? Não é simplesmente para ter o direito moral e sim para auferir uma retribuição econômica. Os autores que dizem trabalhar com finalidade de atender a Deus também tem um cunho econômico. Eles criam exatamente porque a motivação é a recompensa econômica. As rádios comunitárias se indispõem ao pagamento de direitos autorais alegando que não têm fins lucrativos. No entanto, elas direta ou indiretamente estão fazendo concorrência às emissoras comerciais que pagam seus impostos e recolhem tributos. E as rádios comunitárias não querem contribuir com o mínimo exigido. É praticamente uma retribuição simbólica.
Serviço:
A nova Lei de Direitos Autorais está disponível para consulta pública até o dia 31 de agosto no www.cultura.gov.br/consultadireitoautoral
Ludovico Albino Savaris – Advogado